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Sotaques de carioca, mineiro, paulista e... capixaba?

Gírias de MG, RJ, SP, e afinal... qual é o sotaque do capixaba?



No meio dos diferentes modos do brasileiro falar, os sotaques da Região Sudeste são os mais fáceis de identificar e aqueles que mais mudam de um estado pra outro, com exceção do ES, que eu vou explicar no fim.

Quando você ouve um mineiro, carioca ou paulista falando, já saca de primeira quem é quem. E eu fui perceber isso nas primeiras vezes que fui pra fora do sudeste, seja no nordeste e ou no sul.

Viajando, você confunde sotaque de baiano e cearense, vê uma jeito parecido entre gaúcho e catarinense... Porque eles misturam vocabulário, muitos trejeitos são os mesmos, e até a levada das palavras, coisa que não rola no sudeste, onde acontecem algumas particularidades de cada região.



Como uma vez em que fui pro Rio, e como tem muito gringo por lá agora, galera fala tudo em inglês... Eu chegando no meio de uma roda de conversa num bar, ouço a menina dizer "Why?"... E penso: "Ela disse 'why'? Ou eu ouvi mesmo um 'UAI'?!". Falei com a menina, ela caiu na gargalhada e confirmou ser mineira, além do orgulho do "uai". E ela tinha um inglês perfeito, mas foi impossível não perceber o sotaque.

Assim como o "qual é?" (no Whatsapp vira "koeh") do carioca ou o "firrrmeza" do paulistano, o "uai" mineiro é inconfundível. E além de ser o mais gostoso de se ouvir e falar, o vocabulário mineiro é o mais criativo, com alguns termos que só mineiro entende, como é o caso do "trem".

"Trem" é meio que um sinônimo de "coisa" em MG, ou seja, tudo é "trem", inclusive dentro do trem. Uma vez esperando o trem partir em BH, ouvi o camarada carregar uma mala cheia e dizer: "esse trem tá pesado!". Brinquei na hora: "peraí!? Mas qual 'trem' tá pesado? É a mala ou o trem??!"... E essa aí até dava pra entender, mas o difícil é entender o que é "marrado no toco", "biboca" ou "tô na rôia"...



Em algumas viagens, também percebo um lance legal que rola em carioca e o paulista da capital, chamado de paulistano. O pessoal de SP e do RJ não percebe que tem sotaque.

Já cheguei uma vez em um hostel de Salvador, e começando a conversar com uma menina, pergunto: "você é paulistana?". Ela não entendeu como eu percebi, e disse que sentia não ter sotaque.

Pois bem, expliquei que já tinha matado a charada quando ela disse "meeeooo" (meu), mas tem uma peculiaridade do sotaque paulistano que é a ênfase nas vogais "E" e "O", e nas consoantes "N" e "T" (além de puxar um pouco o "R"). Dá pra perceber bem quando falam em gerúndio, tipo "entendêndo", "atendêndo"...



E esse jeito de paulistano falar é bem interessante, porque é quase que uma viagem pra Itália ou um mergulho na história, no período em que a cidade recebeu muitos imigrantes. Essa ênfase que eu falei, você escuta quando um italiano fala. É "caspiTa", "malÊdÊTo", "ma cÔmÔ", "bÔm giÔÔÔRRno. O clássico "meeeooo" é muito Itália.

Agora, também é compreensível o paulistano ou o carioca não perceber que tem sotaque, porque as gírias de São Paulo ou do Rio são muito difundidas. Brasil afora, muita gente já incorporou o "mano", o "se pá" ou o "sussa" de Sampa, e também o "manero", "saquei" e o "boto fé" do carioca... Mas ainda assim, a entonação nas duas cidades é quase que única.

Mas digo a vocês também, que se tem uma gíria carioca que é só carioca, é o tal do "maluco". Certa vez, tava em um bar no Largo da Ordem com um carioca, lá em Curitiba, e ele comenta de um "maluco" gritando na rua. O cara tinha pinta de maluco mesmo, gritando pro nada: "Joãããooo, cadê vocêêêê?". Mas aí, o carioca chama o garçom "ô maluco!", me chama de "maluco", chama o taxista de "maluco", e aí um uruguaio quis entender qual era do "maluco", e o carioca explicou que "maluco" era gíria para "cara", "camarada", e por aí vai.



E pra mim, essa é a grande vantagem do carioquês, que o carioca fala sem frescura e sem medo de ser politicamente incorreto. E o melhor, por não ter frescura, carioca fala palavrão pra c******, levando numa boa. Já vi tiazinha chique de Copacabana falando no supermercado "me dá aqui essa bu****", sem a menor encanação ou sem a intenção de ser mal educada...

Mas quanto ao capixaba... É uma verdadeira incógnita. Eu sou capixaba, e já me disseram que eu falo "cantando igual baiano" (né, Sarah?), que eu falo "igual carioca mas sem puxar o esse", e um brother meu do Rio, me disse que eu sou um "carioca caipira" (?!).

Uma vez, uma tiazinha do interior de Minas falou que sotaque de capixaba era bonito, "porque parece com sotaque de novela". Uma observação bem curiosa, porque na televisão ninguém tem sotaque, e é o que mais dizem de capixaba: "capixaba não tem sotaque".

No entanto, conversando com um professor de português uma vez, ele explicava que "não é que capixaba não tem sotaque, mas é que rola um sotaque parecido com o de Brasília", ou seja, é uma cidade no meio do Brasil, que recebeu muita gente de fora, misturou tudo e hoje parece que não tem sotaque.

É tanto, que na BA se fala "arroz e fêjão" e no RJ se pronuncia "arroiz e feijão", e como o capixaba tá no meio dos dois, Vitória juntou tudo e na cidade se fala "arroiz e fêjão".

O que tem de mais marcante entre os capixabas são as gírias. Por receber muita gente de outros estados, o bacana é que o ES é uma verdadeira feira livre de gírias, onde você de repente você ouve alguém falando um "da hora" paulistano, um "eita porra" baiano ou um "guri" do RS, e nem sabe de onde aquilo surgiu. O capixaba incorpora tanta gíria, que palavras como "pocar", "massa véi", "moqueca", "gastura", você ouve pelo Nordeste, mas lá mesmo as pessoas já entendem como gíria capixaba.

Mas tirando por um panorama geral, essa parada de sotaque serve pra ver como que o Brasil pode ser tão diferente, em um raio de 200 metros. Não só no vocabulário, mas no comportamento, modo de se vestir, modo de encarar a vida, culinária... E por aí, a gente entende que esse papo de "o brasileiro é muito 'isso'" ou "o brasileiro é muito 'aquilo'", não tem nada a ver... Pois, se querer criar rótulos ou esterótipos pra pessoas já é um negócio ultrapassado, fica ainda mais tosco em país de dimensões continentais e com tantas diferenças.

Pra fechar, segue aí um glossário das gírias que foram citadas no texto:

VOCABULÁRIO CAPIXABA:
GASTURA = agonia ou aflição com algo irritante, como um arrastar um giz no quadro-negro ou colocar o dedo na pupila.
MASSA VÉI = uma situação ou coisa legal, bacana...
MOQUECA = peixada. Moqueca é algo que parece comum no vocabulário brasileiro, mas tem lugar na Região Sul que as pessoas só entendem peixada.
POCAR = algo como "mandar muito bem", arrebentar, arrasar. Tem origem da palavra "espocar", aí vale também como estourar.

VOCABULÁRIO CARIOCA:
BOTO FÉ = quer dizer "ah, sim! entendi" ou "concordo contigo".
MALUCO = um sujeito qualquer, cara, amigo.
MANERO = mesma coisa do "massa véi" do capixaba.
QUAL É? = algo como "tudo bem contigo?" ou "como vai você?", tipo um "what's up", em inglês.
SAQUEI = "entendi".

VOCABULÁRIO MINEIRO:
BIBOCA = um lugar muito distante e mal habitado, equivale a um "quinto dos infernos", ou "onde Judas perdeu as botas".
MARRADO NO TOCO = equivale a "estou em um beco sem saída" ou "de mãos atadas".
TÔ NA RÔIA = muito ocupado ou em uma situação complicada.
TREM = um objeto ou coisa qualquer.
UAI = tem vários significados. Por expressar "mas é claro", "não me diga?", uma simples exclamação, dúvida em uma resposta, pra concordar com algo, depende do contexto do diálogo.

VOCABULÁRIO PAULISTA:
FIRMEZA (MANO)? = a mesma coisa do "qual é" carioca, "tudo bem contigo?", "como vai você?"...
MANO = quer dizer cara, camarada, amigo...
MÊO (MEU) = a mesma coisa de "mano".
SE PÁ = equivale a algo como "de repente" ou "se der bobeira".

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